Quando o sol não havia cessado o brilho,
Quando a tarde engolia aos poucos
As cores do dia e despejava sobre a terra
Os primeiros retalhos de sombra
Eu vi que Deus veio assentar-se
Perto do fogão de lenha da minha casa.
Chegou sem alarde, retirou o chapéu da cabeça
E buscou um copo de água no pote de barro
Que ficava num lugar de sombra constante.
Ele tinha feições de homem feliz, realizado.
Parecia imerso na alegria que é própria de
De quem cumpriu a sina do dia e que agora
Recolhe a alegria cotidiana que lhe cabe.
Eu o olhava e pensava:
Como é bom ter Deus dentro de casa!
Como é bom viver essa hora da vida
Em que tenho direito de ter um Deus só para mim.
Cair nos seus braços, bagunçar-lhe os cabelos,
puxar a caneta do seu bolso
E pedir que ele desenhasse um relógio
Bem bonito no meu braço.
Mas aquele homem não era Deus,
Aquele homem era meu pai.
E foi assim que eu descobri
Que meu pai com seu jeito finito de ser Deus
Revelava-me Deus com seu jeito infinito de ser homem.
Fábio de Melo
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