O futuro da pregação cristã
Pe. Zezinho, scj
Não sou profeta e nunca disse que era. Quem me chama de profeta arrisca-se a errar. Mas sou de fazer constatações e prever o futuro em base ao presente e ao passado. Se estou numa colina e vejo uma cachoeira à frente, a menos que os barcos tenham bons pilotos e motores fortes temo por aqueles barcos que vejo singrando por aquelas águas. Nas águas da comunicação religiosa há muitos barcos sem remos, sem motores e muitos pilotos despreparados que acham que seus frágeis remos darão conta da correnteza. A mídia é um tipo de enchente que se avoluma quando menos se espera. Não são águas mansas.
Fiz minha própria pesquisa, os e-mails que recebo em resposta aos meus artigos sobre comunicação - até agora 120 -a reação dos meus leitores, alunos e ouvintes e telespectadores muniram-me de dados suficientes para afirmar o que tenho afirmado: -"Não vejo um futuro suave para as igrejas e os pregadores da fé na mídia".
Quem me conhece sabe que sou otimista e procuro ver um lado bom em tudo, mas, quando a realidade é gritante, não há como fugir dela. E a realidade da pregação cristã está cada dia mais gritante. Estudo-a há mais de 30 anos e acho que sei do que estou falando. Há uma rejeição cada dia mais crescente contra os pregadores católicos, evangélicos e pentecostais na mídia. São diversos os motivos:
1-Espiritualidade desencarnada e exagerado pietismo, beirando à pieguice.
2-Despreparo visível de grande parte dos pregadores.
3-Com raras e admiráveis exceções, amadorismo gritante dos apresentadores,
cantores e artistas.
4-Mesmice generalizada e repetição abusiva dos mesmos temas, mesmas
pessoas, mesmas sentenças, mesmos comandos.
5- Abuso de vidências, revelações, linguagens e milagres.
6- Visível manipulação da boa fé dos fiéis.
7- Arrecadação abusiva, preços abusivos e exigências absurdas.
Nos documentos da Igreja Católica podem ser encontradas as observações que, desde o Vaticano II nos anos 60 se fazem aos pregadores da fé e que, não observadas, afetariam o processo de evangelização. A Declaração de Puebla e o Documento de Aparecida alertam para o mesmo tema. Os números 480, 486 e 497 falam de mudanças culturais e de "modelos antropológicos incompatíveis com a natureza e a dignidade do homem". Propõem que se neutralize a cultua de morte com a cultura cristã da solidariedade. E sugerem que a Igreja prepare os sacerdotes para serem formadores de opinião. Mas não qualquer opinião. Devem eles dar uma visão cristã e cultural através da mídia, que a grande influenciadora de comportamentos.
As pregações precisam, pois, ser também de cunho social e não apenas de conversão ou somente espirituais. Há que haver o transversal da fé. O documento é claro quanto à situação sócio-política da America latina, sobre a globalização, sobre a ecologia, sobre as novas situações de morte e de marginalização, sobe o empobrecimento gradativo e gritante das massas. Tudo isso tem que ser dito no rádioe na televisão. Temos mídia também para isso. Mas não tem sido usada para isso. A predominância da mensagem de louvor e exaltação abafou os gritos de justiça e paz desses documentos. A pregação foi na direção do altar e da Bíblia, o que é bonito e recomendável, mas ficou lá. Não escorreu para os viadutos e para os lugares tristes do país para levar a libertação e a mensagem de resgate. Ainda se ouve pouco pregar sobre os problemas sociais e as dores da América Latina. Não se repercute o Compêndio de Doutrina Social da Igreja, melhor dizendo, das igrejas. E aí começa a minha profecia: preocupa-me o futuro da pregação cristã que olha demais para cima e pouco para os lados, que canta apenas a parte espiritual dos salmos e ignora a parte política e social. Dos 150 salmos cerca de 130 falam da dor de um povo e dos amores deste povo. Isso não é cantado nem nos templos, nem nas emissoras, nem nos palcos. .Perdeu-se a dimensão da compaixão. Canta-se e prega-se muito pouco sobre o " Tenho pena deste povo que já faz três dias que não come".....( ) Dai-lhes vós mesmos de comer... ( ) Há mais braços abertos diante do sacrário do que estendidos para os que precisam de ajuda.
Com raras exceções aquelas passagens não foram levadas a sério no rádio e na televisão. A impressão que se tem é a de que os responsáveis por aqueles programas de rádio e de televisão não leram os textos dos bispos a esse respeito ou, se leram, não lhes deram importância. O que se ouve e se vê são pregadores amadores, despreparados, a maioria dos quais não tem familiaridade com livros essenciais para a pregação cristã. Percebe-se que não leram sobre a doutrina social da Igreja e que conhecem pouca teologia. Basta ouvir e constatar. O mesmo acontece nas esferas do pentecostalismo de raiz protestante. (continua)
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