Eu era jovem e me sentia forte. Naquela manhã de primavera, saí de casa e gritei:
- Estou disponível, quem me quer que me pegue.
Pela estrada passava o Rei com seu séquito de mil guerreiros.
– Eu te aceito ao meu serviço – disse o Rei parando o cortejo – Receberás parte do meu poder. Mas do poder dele eu não sabia o que fazer e o deixei ir embora.
– Estou disponível para todos. Quem me quer? – Repeti. Naquela tarde de sol, um velho pensativo me parou e disse:
- Eu te contrato para os meus negócios. Vou te pagar com muito dinheiro – e me mostrou um monte de moedas de ouro. Mas eu não sabia o que fazer do dinheiro dele e me virei do outro lado.
Ao anoitecer cheguei perto de um casebre. Apareceu uma linda jovem e falou:
Eu te aceito. Terás o meu sorriso como recompensa.
Eu fiquei perplexo: quanto dura um sorriso? Entretanto aquele sorriso desapareceu e a jovem sumiu nas sombras. Passei a noite deitado na grama e de manhã estava todo molhado pelo orvalho.
- Estou disponível, quem me quer?
O sol já brilhava sobre a areia quando percebi que tinha uma criança sentada na praia brincando com três conchinhas. Quando me viu, levantou a cabeça e sorriu:
- Eu te quero – ela falou – e em troca não tenho nada para te dar.
Aceitei o contrato e comecei a brincar com ela. Às pessoas que passavam e perguntavam por mim, respondia:
- Não posso, estou muito ocupado. A partir daquele dia, senti-me um homem livre.
Peguei emprestada esta bela página do poeta Tagore. No domingo de Pentecostes, devemos refletir sobre o Espírito Santo, a “força do alto”, o advogado, o consolador, prometido e doado por Jesus. Ele mesmo quando falou do Espírito a Nicodemos o comparou ao vento, porque sopra onde quer e ninguém sabe de onde vem e para onde vai (cf. Jo 3,8). Não tem portas e nem janelas que possam segurá-lo. O Espírito é a liberdade de Deus para amar. Uma liberdade que, parece uma contradição, o obriga a amar. Deus não escolhe e por isso não pode errar e nem fazer menos, pior ou diferente. É a perfeita liberdade de fazer e escolher sempre o único melhor: amar. Também se pode custar a vida do Filho encarnado.
O Espírito é o contrário do interesse, da ganância, do lucro e da vantagem. O Espírito é pura gratuidade. Se não fosse assim, se Deus escolhesse as coisas para ter algo em troca, esta, sim, seria uma contradição do amor. Não seria mais o amor total. Como as brincadeiras das crianças, muito ocupadas em gastar livremente as suas energias. Liberdade e gratuidade juntas para amar.
Pensando bem, o Espírito Santo é também o contrário da prudência, do medo, dos cálculos estratégicos.
Os apóstolos perdem o medo, as portas são escancaradas; não para que entrem os judeus ameaçadores, mas para que eles possam sair. A boa notícia de Jesus agora está livre para chegar até os confins da terra.
O Espírito Santo é o contrário da dúvida, da confusão, da desunião. A fé é proclamada sem titubeios: Jesus é o Senhor. O anúncio é ouvido e compreendido por cada um em sua própria língua. Os povos continuam diferentes com sua própria história e sua própria cultura, mas agora se encontram para formar um único corpo onde as diversidades enriquecem e vale para todos e acima de todos o bem comum.
O dia de Pentecostes é também o dia do envio em missão. Depois daquele dia, o Evangelho nunca mais voltou atrás. Nós, os cristãos, é que podemos ficar parados, podemos ter resolvido dar um tempo, decidido descansar. O Espírito Santo não, porque vai à nossa frente, antecipa-se, prepara os ouvidos e os corações para que acolham a Palavra de Vida. O Espírito Santo é a força da evangelização. Ajuda o pregador a falar, o catequista a explicar, os pais a educarem na fé os seus filhos. Mas também está com os filhos, com os que buscam a verdade e até com os indiferentes, incomodados pela Boa Notícia.
O Espírito não promete nada em troca. Ele mesmo é a meta e o prêmio. É só gratuidade e liberdade porque somente é amor.
Dom Pedro José Conti
Bispo de Macapá (AP).
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